Meras Imagens...

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Karen Facchinetti

terça-feira, 10 de junho de 2008

Buena Vibra

Veste uma renda, de um vermelho vibrante e escuro que eleva sua brandura. Contrasta com o algodão de uma pele que reluz, que ainda se protege e acostuma-se com o mundo que vê.
Sua blusa rendada cola-se ao seu corpinho miudo e traduz uma linhagem ritana que esconde um sangue borbulhante e quente que ainda não tem consciência.
Está só, numa solitude ancestral sem causa e efeito. Transpõe um tempo que julgo ser longo e regresso. Seus olhos projetam cenas antigas e de uma metáfora que transforma a atmosfera.
Seus pezinhos mal alcançam o chão. A desproporção da cena chama-me a atenção.
Com sues ombrinhos caídos permanece com a acbeça em direção ao céu num sorrir de alma, pois sua face é séria, sem desperdícios de sentimentos.
Parece apreciar as estrelas e num leve movimento de suas mãos acompanha uma música longingua, ao fundo, perdida em qualquer sombra daquela escuridão. Vem de uma vitrola que soa um tom rouco e nostálgico. Surpreendo-me com seus gestos.
Aqueles movimentos pequeninos, tão sutis e seguros reconhecem em cada toque o seu ritmo. É um tango.
Está descalça, lhe faz bem a sensação da ausência de amarras. Com certeza esquecera um belo par de chinelos em algum canto de suas travessuras inocentes.
Avista uma joaninha na pontinha de seu dedo. Contempla, enternece o semblante, sopra.
Pela primeira vez, percebe a minha presença. Sente-se confortável, nem um pouco intimidada. Olha-me sem piscar um instante, fita-me a alma através de um encontro óptico. Me assusto...
Meu Deus, é uma criança! Olha-me com ares de um encontro, fita-me como que num prenuncio, pensa pronunciar, cansa-se. Dança, ri, grita: Buena Vibra!
Sinos soam neste instante.
Pula daquele banco como quem pula das nuvens. Sonda, recua, persiste. Corre por detrás dos postes, ilumina-se através dos lampeões.
Eu, intacta, imóvel. Canto, rio , danço...
Avisto esquecido no banco uma geometria agora reconhecida.
Sento, pés sobre o chão, olhar ao céu, ombros caídos, embriago-me daquela música. permaneço horas num sorrir de alma. Aperto contra o peito um disco de Carlos Gardel. É tudo o que tenho.
Sinto tudo outra vez.
Não sei até quando permanecerei aqui...

3 comentários:

Marcelo Fabri disse...

Mais um texto que deixa a gente sem fôlego. Gostei muito. Pelo jeito você domina bem a arte de dar detalhes, de colocar descrições profundas e não deixar o leitor perdido na cena. Parabéns!!
Beijo

Vivi Peron disse...

Isabel, assim como no comentário do "Marcelito", tb quero elogiar a riqueza de detalhes do seu texto, muito bom, achei tb interessante o mistério que a princípio não se deixa perceber que está descrevendo uma criança.
Bjs!!!

Casimiro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.