Meras Imagens...

Meras Imagens...
Karen Facchinetti

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Trecho - Olhares fora-dentro

Estes dias vim folheando trechos do livro Fotografia e Antropologia – olhares fora-dentro de Rosane de Andrade. Um livro no qual me identifico muito quanto ao envolvimento do fotógrafo com aquilo que deseja fotografar. E hoje folheando alguns pensamentos nele contido, deparei-me com uma citação de um fotógrafo esloveno que perdeu a visão aos 11 anos de idade. Até hoje suas palavras e profundidade com que se relaciona com o mundo através dos sentidos me inspiram a enxergar e viver as imagens através de uma filosofia.Vale a pena ler este singelo e profundo pensamento.


“ Quando discernia ainda alguns bocados de luzes e de cores, estava feliz porque via ainda: guardo a lembrança viva desses momentos de adeuses ao mundo visível. Mas, a monocromia invadiu minha existência e devo fazer um esforço em conservar a paleta de nuanças, para que o mundo escape a monotonia e a transparência. Dou cores aos objetos, às pessoas que apreendo: conheço uma mulher cuja voz é ao azul que ela consegue colocar o azul sobre um dia que eu sei ser cinza de outono.Encontrei um pintor que tinha uma voz vermelho-escura, e o acaso quis que ele gostasse desta cor... O que vem ser portanto um olhar? É talvez a soma de todos os sonhos, cuja parte de pesadelo se esquece, quando a gente pode pôr-se a olhar diferentemente... “ (Evegen Bavcar)

terça-feira, 10 de junho de 2008

Buena Vibra

Veste uma renda, de um vermelho vibrante e escuro que eleva sua brandura. Contrasta com o algodão de uma pele que reluz, que ainda se protege e acostuma-se com o mundo que vê.
Sua blusa rendada cola-se ao seu corpinho miudo e traduz uma linhagem ritana que esconde um sangue borbulhante e quente que ainda não tem consciência.
Está só, numa solitude ancestral sem causa e efeito. Transpõe um tempo que julgo ser longo e regresso. Seus olhos projetam cenas antigas e de uma metáfora que transforma a atmosfera.
Seus pezinhos mal alcançam o chão. A desproporção da cena chama-me a atenção.
Com sues ombrinhos caídos permanece com a acbeça em direção ao céu num sorrir de alma, pois sua face é séria, sem desperdícios de sentimentos.
Parece apreciar as estrelas e num leve movimento de suas mãos acompanha uma música longingua, ao fundo, perdida em qualquer sombra daquela escuridão. Vem de uma vitrola que soa um tom rouco e nostálgico. Surpreendo-me com seus gestos.
Aqueles movimentos pequeninos, tão sutis e seguros reconhecem em cada toque o seu ritmo. É um tango.
Está descalça, lhe faz bem a sensação da ausência de amarras. Com certeza esquecera um belo par de chinelos em algum canto de suas travessuras inocentes.
Avista uma joaninha na pontinha de seu dedo. Contempla, enternece o semblante, sopra.
Pela primeira vez, percebe a minha presença. Sente-se confortável, nem um pouco intimidada. Olha-me sem piscar um instante, fita-me a alma através de um encontro óptico. Me assusto...
Meu Deus, é uma criança! Olha-me com ares de um encontro, fita-me como que num prenuncio, pensa pronunciar, cansa-se. Dança, ri, grita: Buena Vibra!
Sinos soam neste instante.
Pula daquele banco como quem pula das nuvens. Sonda, recua, persiste. Corre por detrás dos postes, ilumina-se através dos lampeões.
Eu, intacta, imóvel. Canto, rio , danço...
Avisto esquecido no banco uma geometria agora reconhecida.
Sento, pés sobre o chão, olhar ao céu, ombros caídos, embriago-me daquela música. permaneço horas num sorrir de alma. Aperto contra o peito um disco de Carlos Gardel. É tudo o que tenho.
Sinto tudo outra vez.
Não sei até quando permanecerei aqui...

domingo, 1 de junho de 2008

Pensamentos Noturnos...


02h00 da madrugada. Aqui ainda é claro... O relógio insiste e me diz que logo irei trabalhar.
Não pretendo expulsar o sol agora, deixo ele ficar só mais cinco minutos.
Pensamentos noturnos são claros e este sol não se cala. Se não quer ir que sorria, não afugento o que é divino. Aproveito as horas concedidas para fussar uma câmera escura interior.
Claro e escuro contrastam nesta noite que não se apaga. Só mais um minuto e eu levanto daqui.
Meus devaneios já passaram da hora...



Banalização do ver.

Para muitas pessoas a fotografia é algo comum, que define um ritual familiar de identificação ou mesmo de afirmação. Claro que essas definições existem e são inerentes ao surgimento da foto. Mas também é real que hoje a fotografia passa por um forte processo de banalização que vem crescendo dentro da cultura da imagem e reforçado por aparelhos ideológicos no decorrer dos anos.Claro que é preciso e é até mesmo enriquecedor alimentar interesse pela tecnologia que nos traz formas cada vez mais avançadas de capturar as imagens. O que me intriga é a forma desvairada, frenética e comum de” ver” essas imagens no atual momento.A idéia absurda de que um fotógrafo seja reconhecido pelo equipamento que tem me traz certo incomodo. Talvez para muitos seja um pensamento pequeno e de uma fotógrafa que mal saiu das fraudas. Mas me incomoda muito desvalorização dessa arte. Quando realmente é arte.É como se ter uma máquina digital fosse melhor que ter um equipamento analógico, como se as imagens digitalizadas fossem estupidamente melhores em resolução simplesmente por serem geradas em equipamentos de última geração. Não há aqui crítica alguma sobre esta forma de tecnologia, mesmo porque vem facilitando minha vida profissionalmente, uma forma de adaptação ao mercado também.Mas no meio desse bombardeio de megapixeis, ainda preservo minhas películas. Não abandono meus filmes por nada.Não vou dizer que tenho usado absurdamente como antes, seria uma mentira, mas ainda quero registrar concretamente meus ensaios e testar o conhecimento, o raciocínio e ter a surpresa da revelação. Quero ter o pensamento da iluminação ativa.Outro dia procurando um curso de fotografia me deparei com grades curriculares de desanimar. Entre tantas coisas a se aprender não encontrei o mais importante: Revelação em preto e branco. Como não é possível encontrar tal matéria! Ali, no momento de um entrosamento químico, entre quarto escuro, meia luz e muita paciência é que podia se aprender na raça as escalas do mundo, dos tons...O que eu quero dizer com isso, é que as pessoas vão se utilizando cada vez mais da tecnologia que lhes é enfiada pelas propagandas , achando que têm nas mão os melhores recursos, o que não é verdade e quando as tem não estão preparadas para utilizar com seu rigor e criatividade, achando que não precisam de mais nada e mais ninguém .A questão também não é essa, todo ser humano é capacitado em sua forma de pensar, mas assim como os médicos têm nas mãos ferramentas e conhecimento específico para salvar vidas quando Deus lhe permite, além claro, de um dom, o fotógrafo carrega no olhar, na percepção, na alquimia de registrar o mundo e de captar a luz, conhecimento e ferramentaspara traduzir esse mundo através de uma estética e o mais importante, de um sentir.Quando enquadro uma imagem e disparo o obturador, algo é transformado em mim, algo se transforma de dentro para fora e volta ao meu mundo. Não deixo de sentir o momento, ao contrário, utilizo da lente para como relação do sentir e de existência na sociedade.Mas enxerg o que muitas pessoas estão preocupadas em capturar almas o tempo todo, esquecem de sentir o momento e feito loucas disparam algo que nem sabem o quê. Quando não sabem o que lhes acontece em seu interior, atiram, se não conseguem chorar, atiram, se estão felizes, atiram, mas não sabem definir seus sentimentos....Perdem o exato momento do sentir quando tentam a todo o instante roubar imagens para serem alguém, através do ter, do ter e do ter...Sei que o reflexo da sociedade em que vivemos hoje não aliviaria o mundo da fotografia numa filosofia globalizada em que pensamos ter tudo, na qual aglomeramos quinquilharias de países que nos exploram para nos sentirmos felizes e dignos em nossa existência, porque na verdade somos usados, passados para trás, sem saúde, sem educação e sem direito à informações de formação crítica.Enquanto isso, carregaremos televisões , computadores e máquinas fotográficas na palma de nossas mãos, capturando e atirando no mundo para que ele não nos engula de vez. Não me esqueço nunca de um ex chefe que me dizia, passe todas suas idéias para o papel, depois se utilize do computador. E ele estava e está certo!
Nada substitui o homem e o homem é feito de sentimentos!Máquinas são a nossa extensão.Talvez eu seja romântica demais, mas assim como as palavras trazem sua força, as imagens transparecem o que temos na alma. Me entristece o mau uso delas...